Relações Públicas
12-01-2016

Todos os públicos são importantes

LUÍS PAULO RODRIGUES

As ações de relações públicas estão cada vez mais misturadas com as ações de marketing e comunicação, mas continuam a ser relações públicas, tanto em ambiente "offline" como em ambiente "online". E o papel das relações públicas é o de sempre: criar e manter uma boa imagem pública de marcas e organizações e abrir e manter canais de entendimento com todos os públicos. Porque todos os públicos de uma marca ou de uma organização, sejam eles internos ou externos, prioritários ou periféricos, são importantes para uma estratégia eficaz de comunicação e relações públicas (RP). Sobretudo agora, que cada cliente deve ser visto como um ativo da empresa. Por isso, todos os públicos devem ser bem identificados e definidos, porque um profissional de RP jamais pode considerar um público como genérico – pois todos nós pertencemos a diversos grupos de públicos, em função da nossa origem, raça, religião, ideal político, clube desportivo, situação económica, formação académica, etc.
Um conhecimento profundo dos públicos é, portanto, decisivo para um profissional de RP saber que papéis esses públicos ocupam na sociedade e como segmentá-los, tendo em vista diferenciar as mensagens; e perceber como é que os públicos ganham existência e respondem de determinada forma. É a partir desse trabalho que é definida a estratégia de comunicação mais adequada para atingir os diversos públicos.
Entre os teóricos das relações públicas, ganhou estatuto de conceito dominante a perspetiva situacional, enunciada pelos norte-americanos James Grunig e Fred Repper (1992), segundo a qual um público resulta de um estado motivado por uma situação problemática e não constitui um estado de consciência permanente. Ou seja, um público é concebido como um estado no qual se pode permanecer durante mais ou menos tempo, podendo nascer como resposta a um problema, organizando-se para resolvê-lo por meios próprios. Neste contexto, uma situação de crise de comunicação pode, muitas vezes, ser motivada ou ampliada por um público que, de forma espontânea ou organizada, se envolveu para reagir negativamente a um determinado episódio protagonizado por uma marca ou organização.
Para se chegar ao estado de público – associado a pessoas ativas e conscientes – é necessário, contudo, passar pelo estado de “stakeholder”, uma fase preliminar em que se encontram as pessoas que afetam ou são afetadas pelas ações, decisões, políticas ou práticas de uma organização. Nesta situação, podemos encontrar empregados, clientes, consumidores, meios de comunicação, comunidade, fornecedores, investidores, parceiros de negócio, legisladores, etc.
Quando o “stakeholder” abandona a sua relativa passividade e reconhece um problema, aumenta o nível do seu envolvimento com a organização, transformando-se, assim, num público. Caso um público não fique satisfeito com o comportamento da organização, chega ao estado dos assuntos ou das polémicas. Mas para Grunig e Repper, o modelo de gestão estratégica das RP deve permitir resolver os problemas antes da sua transformação em assuntos ou polémicas. No mundo em que vivemos, essa resolução preventiva pode não ser possível, nomeadamente quando estamos perante uma crise de comunicação no espaço digital, ou uma situação de crise surgida no espaço “offline” que saltou instantaneamente para o espaço digital. São situações que atualmente acontecem com frequência e que implicam uma reação rápida por parte das RP digitais.
Boton e Soto (1998) criticaram a teoria situacional de Grunig e Repper, avançando com uma conceção dos públicos centrada na linguagem e no papel de responsabilidade social das organizações. O pressuposto de que os públicos só aparecem como resposta a uma situação problemática também foi criticado, uma vez que isso negligencia o estudo do funcionamento interno e proativo do público, bem como o estudo do papel da comunicação nesse processo.
Estas ideias vão de encontro às mudanças que a Internet desencadeou no marketing contemporâneo, sobretudo com a emergência do Marketing 3.0 – um estádio assim identificado por Philip Kotler, em que a rendibilidade está a par da responsabilidade social, em que as empresas encaram os clientes como um ponto de partida estratégico, abordando-os tendo em conta todos os aspetos da sua humanidade, designadamente as suas necessidades e os seus interesses, numa interação direta e duradoura, como acontece, por exemplo, através do marketing experiencial.
Esta visão convoca ações de RP cada vez mais imaginativas e planeadas na valorização dos públicos de marcas e serviços. Porque o valor de um cliente não resulta de uma única compra, mas das compras do cliente feitas ao longo de toda a sua vida. Isto é, um cliente vale muito mais que uma simples compra e os profissionais de RP têm de ter isso em conta nas ações de comunicação.
Um pequeno exercício, tomando como exemplo o cliente de um supermercado, ajuda a ilustrar esta ideia: uma pessoa que gasta mensalmente 400 euros no supermercado, supondo que ela começou a fazer as suas compras com 25 anos de idade (pois antes vivia com os pais e as compras eram realizadas pela família) e que viverá até os 77 anos de idade, no total, essa pessoa gastará o equivalente a 250 mil euros em compras no supermercado ao longo da sua vida. Isto sem contar as possíveis indicações, junto de potenciais novos clientes do supermercado ao longo desse tempo. Por isso, quando um cliente entra na porta de um supermercado, cada funcionário tem que ver nele um potencial de 250 mil euros e não apenas uma compra irrelevante de 10 euros em frutas e legumes que esse cliente possa fazer nesse dia. Esta visão muda toda uma lógica de atendimento e valorização dos clientes, exigindo estratégias de RP para a fidelização de clientes.
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